A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou habeas corpus a comandante estrangeiro que teria impedido a fiscalização de agentes ambientais no navio Sea Way Harrier na costa brasileira. O comportamento teria decorrido da equivocada premissa de que a inspeção não seria de competência dos servidores do Ibama, mas sim da Capitania dos Portos.
Em setembro de 2003, o comandante e outra pessoa da tripulação teriam impedido dois agentes de verificar o livro de óleo e apurar eventual bioincrustação no casco da embarcação operada pela empresa Stolt Offshore. A ação visava à preservação da reserva extrativista marinha de Arraial do Cabo (RJ), criada para garantir a atividade pesqueira artesanal da comunidade local. A incrustação de seres vivos como mexilhões e algas nos cascos de navios pode provocar desequilíbrios ecológicos decorrentes da introdução de espécies exóticas no ambiente.
O fato se repetiu quase dois anos depois, envolvendo novamente um dos agentes e o comandante do mesmo navio. Ele foi, então, denunciado perante a Vara Federal de São Pedro D’Aldeia por “obstar ou dificultar a ação fiscalizadora do poder público no trato de questões ambientais” por duas vezes. O crime é previsto no artigo 69 da Lei 9.605/98.
O pedido de trancamento da ação foi negado na segunda instância pelo Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2). No pedido de habeas corpus ao STJ, a defesa do comandante sustentava a atipicidade da conduta por ausência de dolo e a inépcia da denúncia, a qual estaria amparada em responsabilidade penal objetiva.
Quanto ao primeiro argumento, a defesa sustentou que o comandante havia agido em erro por entender que a fiscalização deveria ser feita pela Capitania dos Portos. Sobre o segundo, argumentou que o comandante foi denunciado apenas por sua função, sendo responsabilizado penalmente de forma objetiva – o que é vedado pelo ordenamento jurídico.
O relator do caso, ministro Og Fernandes, considerou que “são atributos do ato administrativo a presunção de legitimidade, imperatividade, exigibilidade e executoriedade”. Para o ministro, “não se trata de presunção absoluta, como se sabe, pois o ato pode ser invalidado, caso demonstrada a sua ilegitimidade”, mas “o particular deve obediência a ele até que seja reconhecida a sua nulidade”.
A ação fiscalizadora tentada pelos agentes tinha suporte na Constituição Federal e na Lei 9.966/00. “Daí concluir, em princípio, não ser o caso de recusa a ato administrativo ilegal, emanado de autoridades manifestamente incompetentes”, afirmou o relator.
Citando trecho do acórdão do TRF2, o ministro ressaltou que “o particular não pode se opor a essa ação fiscalizadora” por entender que a atribuição seria de outro órgão, sob o risco de esse comportamento ser “álibi para a não incriminação em geral em relação a esse tipo penal”.
Por fim, Og Fernandes considerou improcedente a alegação de que a denúncia responsabilizou o comandante objetivamente. Para o ministro, não lhe foi imputado o delito apenas por ser o comandante do navio, mas sim “porque dele adveio a ordem para impedir a fiscalização ambiental”.
Fonte: STJ