09 jun 2009 @ 11:48 AM 

Em 17 de abril de 2009, passou a integrar a ordem jurídica brasileira, a Lei Ordinária 11.923. O diploma parece ter recebido inspiração naquela esteira de política de resposta imediata e contingente, comumente adotada entre os que editam as leis de nossa República. Assim, para mostrar serviço e dar satisfação à população, eis que o Congresso Nacional inventou o crime chamado “Sequestro Relâmpago”. Afinal, alguém tinha que tomar providências quanto a essa prática delituosa em ascensão no Brasil, principalmente nos grandes aglomerados urbanos… Não é assim?

Recentemente, um amigo meu foi vítima de uma ação dessas. Felizmente, o nosso legislador foi rápido e prestativo o suficiente para editar a citada norma antes que o fato acontecesse, fazendo com que a conduta da sequestradora se enquadrasse no, tão demandado por nós, tipo penal do “Sequestro Relâmpago”!

Vale conferir a redação do parágrafo 3º acrescentado ao artigo 158 do Decreto-Lei 2.848/40, o famosíssimo Código Penal, que agora possui mais um notável enfeite:

“Artigo 158. Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, e com o intuito de obter para si ou para outrem indevida vantagem econômica, a fazer, tolerar que se faça ou deixar fazer alguma coisa: Pena – reclusão, de quatro a dez anos, e multa.

Parágrafo 3º – “se o crime é cometido mediante a restrição da liberdade da vítima, e essa condição é necessária para a obtenção da vantagem econômica, a pena é de reclusão, de 6 (seis) a 12 (doze) anos, além da multa; se resulta lesão corporal grave ou morte, aplicam-se as penas previstas no artigo 159, parágrafos 2º e 3º respectivamente.”

Já se sabe que legislar, só, não adianta, mormente em questões penais. Mas o nosso querido legislador fez mais que isso. Ele legislou da forma mais inútil que conseguiu, e em matéria penal, inclusive. Observe-se a redação do caput do artigo 159:

“Artigo 159. Sequestrar pessoa com o fim de obter, para si ou para outrem, qualquer vantagem, como condição ou preço do resgate: Pena – reclusão, de oito a quinze anos.”

À primeira vista, é difícil notar alguma diferença entre extorsão qualificada (artigo 158, parágrafo 3º) e extorsão mediante sequestro (artigo 159, caput). Atente-se: em ambos os casos, os dispositivos legais cingem-se à referência à restrição de liberdade e à obtenção de alguma vantagem por esse meio. A diferença é que na extorsão qualificada a vantagem visada deve ser de cunho econômico e na extorsão mediante sequestro a vantagem pretendida pode ser de qualquer natureza, menos econômica, porque a extorsão qualificada atraiu isso para si, por ser específica quanto ao tema.

Para se ter ideia da semelhança entre os tipos penais citados, basta olhar para a referência do parágrafo 3º do artigo 158 aos parágrafos 2º e 3º do artigo 159. Portanto, além de tudo, o legislador fez questão de patentear sua inépcia.

É difícil encontrar alguma utilidade em termos de política criminal na diferenciação das condutas tipificadas em um e outro dispositivo. É igualmente difícil deixar de encarar o legislador brasileiro como alguém tão desatento, o que é lamentável.

Como visto, a única diferença no tipo que se pode perceber está situada no dolo específico do agente. Dessa maneira, quem visa vantagem econômica, estará sujeito a uma pena de 6 a 12 anos, e não mais à pena de 8 a 15 anos. Dessa maneira, apenas porque a vantagem é de cunho econômico, a pena é mais branda. Assim, na maioria dos casos de “sequestro” (em que se almeja proveito de ordem econômica), a pena cominada será menor.

A única coisa que o legislador fez, de fato, foi abrandar a pena daqueles que praticam extorsão mediante sequestro com intuito meramente econômico (que é o que representa a extorsão qualificada do parágrafo 3º). É bastante improvável que isso tenha passado pela cabeça desse nosso legislador indolente. No fim das contas, o que ele fez foi melhorar a situação de quem ele queria punir. Então, lex mitior neles!

Há, na jurisprudência pátria, intensa celeuma quanto à correta tipificação de certas condutas em que ocorre o uso de violência e a obtenção de alguma vantagem para o agente. Tais condutas acabam recebendo enquadramento tanto na figura do roubo quanto na de extorsão mediante sequestro, por serem ações muito assemelhadas. Existem, inclusive, entendimentos pugnando pelo concurso material e pelo concurso formal de crimes.

Em virtude dessa divergência jurisprudencial, há quem conclua que a Lei 11.923/09 pretendeu dar uniformidade de entendimento, enquadrando o sequestro relâmpago entre os crimes de extorsão, acabando com a celeuma. Se foi esse o intuito com a referida lei, nada se obteve em proveito, porque o legislador limitou-se a repetir um tipo penal já existente, valendo-se de uma técnica legislativa muito ruim. Ou será que não? Em ambos os tipos, sequestrar alguém (ou privá-lo de sua liberdade – tanto faz) é o meio que o sequestrador possui para obtenção de vantagem. Nos dois casos a restrição à liberdade é condição necessária e a obtenção de vantagem é o fim pretendido. A única diferença existente é que no crime praticado para a obtenção de proveito econômico a pena é menor, como demonstrado linhas atrás.

Como se pode perceber, a inovação legislativa foi totalmente desnecessária.

Fonte: AJ – Argumentum Jurídico

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Posted By: TFSN
Last Edit: 09 jun 2009 @ 11:48 AM

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